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  • Resultado da pesquisa sobre o uso de Memantina para pessoas com síndrome de Down – tire suas dúvidas

O periódico The Lancet Neurology, revista médica número um do mundo na área de neurologia, publicou uma pesquisa em janeiro, financiada pela Alana Foundation, que mostra que a utilização de memantina, medicamento recomendado para o tratamento de indivíduos com Alzheimer, pode ser uma opção futura de tratamento para pessoas com T21. No mundo ainda não existem muitas pesquisas sobre a Trissomia 21 (T21) e, sem esses estudos, a descoberta de novos tratamentos, medicamentos e abordagens pedagógicas para as pessoas com T21 se torna improvável.

Diante da importância de falar sobre as formas de tratamento que beneficiem as pessoas com essa condição genética, a Alana Foundation, em parceria com a Federação Brasileira das Associações de Síndrome de Down (FBASD), realizou o webinar “Estudo da Memantina na Trissomia 21 – Resultados e implicações futuras”.

Laís Fleury, diretora da Alana Foundation, ressalta que esse estudo abre portas para um debate ainda maior sobre tratamentos que promovam a saúde da pessoa com T21 e que parte dos testes de avaliação cognitiva aplicados no estudo são inéditos no Brasil, mas seguem parâmetros já utilizados em outros países. “Acreditamos que a participação crescente de pessoas com T21 na sociedade traz benefícios para todos nós. Queremos, com essa pesquisa, trazer mais ferramentas para que essas pessoas possam ampliar a sua atuação e protagonismo nas escolas, mercado de trabalho e sociedade como um todo”, avalia.

Apesar de não ter demonstrado a eficácia esperada no desempenho cognitivo dos participantes, a pesquisa levantou a possibilidade de que pessoas com T21 podem metabolizar medicamentos, como a memantina, de uma forma não usual. O estudo ainda levanta a hipótese de que tratamentos com dosagens maiores possam beneficiar as pessoas com T21. Essa descoberta abre espaço para novos debates sobre tratamentos capazes de melhorar os déficits cognitivos associados à T21.

Ainda serão necessários novos estudos para que a equipe responsável pelo estudo possa avaliar se essa hipótese se confirma, pois assim será possível ter certeza de que a memantina pode melhorar as funções cognitivas e ter impacto na qualidade de vida das pessoas com Trissomia 21. A pesquisa foi financiada pela Alana Foundation, com apoio da Awakening Angels Foundation (EUA), em parceria com instituições dos Estados Unidos e do Brasil.

Participaram do webinar o Dr. Alberto Costa, neurocientista e diretor de Pesquisas Clínicas da associação internacional para pesquisa em T21 – Trisomy 21 Research Society (T21RS) e a Dra. Ana Claudia Brandão, pediatra do Centro de Especialidades Pediátricas do Hospital Israelita Albert Einstein, com atuação voltada para crianças e adolescentes com T21. Ambos lideraram a pesquisa nos Estados Unidos e no Brasil, respectivamente. A mediação foi feita por Alex Duarte, graduado em Comunicação Social, pós-graduado em Neurociências, especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional, e Fernanda Machado, designer gráfica com síndrome de Down que participou da Expedição 21 – Primeira Imersão de Empoderamento para pessoas com deficiência intelectual.

O webinário contou com legenda em tempo real, libras e audiodescrição.
 
 
Descrição da Imagem: No canto esquerdo da imagem está escrito em letras azuis: Estudo da Memantina na Trissomia 21 – Resultados e implicações futuras. Apresentação de pesquisa publicada na The Lancet Neurology.  Tire suas dúvidas. Realização FBASD e Alana. À direita, imagem e nomes dos participantes sobre um fundo azul. No rodapé, fundo rosa e escrito em letras brancas: Legenda em tempo real | Libras | audiodescrição. No canal do YouTube da FBASD – bit.ly/estudo-memantina

 

Assista ao webinário no Canal da Federação Down:

 

 

https://www.youtube.com/watch?v=KMRb02HoSw8

Confira as respostas às perguntas feitas durante a apresentação.

Quais os resultados do estudo?

O nosso objetivo era saber se a memantina poderia melhorar algumas funções cognitivas em adolescentes e jovens adultos com síndrome de Down, e também se ela seria uma medicação segura para esta população. Nossos resultados mostraram que a memantina é segura, ou seja, pode ser usada sem causar eventos adversos importantes se utilizada na dose de 20mg/dia. 

Em relação à eficácia na melhora das funções cognitivas, nós não tivemos resultados positivos: o grupo que tomou a memantina não apresentou melhor performance nos testes neuropsicológicos aplicados no estudo, em relação ao grupo que tomou placebo. Por isso deixamos claro no nosso webinar que ainda não temos evidência suficiente para prescrever a memantina para as pessoas com T21.

Mas tivemos outros resultados muito interessantes:

  1. A maioria dos participantes do grupo memantina não tinha níveis bons da medicação em seu sangue (medimos de todos os participantes ao final do estudo).
  2. Naquele pequeno grupo em que os níveis da medicação no sangue era boa (considerada terapêutica), quando os comparamos com seus pares que tomaram placebo, vimos que eles apresentaram melhora significativa na performance nos testes de memória.

Isto nos fez pensar na hipótese de que jovens possam precisar de doses maiores de memantina para que o nível no sangue seja terapêutico e tenha o efeito esperado: melhora das funções cognitivas. O que precisamos agora: estudar esta população utilizando doses maiores de memantina, inicialmente para saber se esta intervenção é segura. E uma vez se mostrando segura, estudar se é eficaz.

1) PERGUNTA: Qual será o futuro desse estudo da memantina da trissomia 21?

Resposta: Em consequência dos resultados que tivemos neste estudo, temos o desejo de estudar como as pessoas com síndrome de Down, de diferentes faixas etárias, metabolizam esta medicação. Este estudo futuro também poderia nos dar uma idéia inicial se doses maiores do que 20 mg/dia seriam toleradas e seguras para esta população.

Portanto, o caminho agora é tentar um financiamento para dar continuidade ao estudo da memantina.

2) PERGUNTA: Como entender a faixa etária para a pesquisa?

Resposta (Alberto): As razões são mais burocráticas do que científicas. Quando desenhei o estudo piloto no Colorado, a memantina só era aprovada para adultos. Portanto, para que o FDA (Food and Drug Administration, a ANVISA dos Estados Unidos) permitisse que fizéssemos o estudo, tive que usar 18 anos de idade como o limite mínimo de idade. Por outro lado, 32 anos de idade foi usado como limite superior para ficar abaixo da idade típica da patologia de Alzheimer em nossos participantes. Após concluirmos o estudo piloto sem termos visto eventos adversos sérios, o FDA nos permitiu estender o limite inferior para 15 anos. Na verdade, eles provavelmente teriam permitido que o fizéssemos para um limite menor. Mas, determinamos que para uma idade abaixo de 15 anos, teríamos problemas em administrar certos testes neuropsicológicos e teríamos também problemas de dosagem, porque o peso de muitos participantes estaria abaixo de 40 kg que determinamos como sendo o mínimo para usarmos uma dose determinada para adultos. 

3) PERGUNTA:  Onde foi criada a Memantina?

Resposta (Alberto): A história é interessante: a memantina foi criada pela companhia farmacêutica americana Eli Lilly, em 1963, como um potencial agente antidiabético. Mas logo eles descobriram que não tinha o efeito desejado. Contudo, pesquisadores de uma companhia Alemã, a Merz, descobriu que, da mesma forma que outras drogas de composição química semelhante (amantadina e rimantadina), a memantina tinha um efeito antigripal. Em meados dos anos 70, começou a ser usada na Alemanha para doença de Parkinson e outras desordens neurológicas. Mas foi só em 2003 que foi aprovada para o tratamento da doença de Alzheimer, primeiro na União Europeia e depois nos Estados Unidos.     

4) PERGUNTA:  Esse material é acessível? Tem acesso para nós, da pediatria, olharmos? 

Resposta: O estudo está publicado na edição de janeiro/2022 da revista Lancet Neurology. Neste link está disponível o resumo em inglês:

https://www.thelancet.com/article/S1474-4422(21)00369-0/fulltext

Em caso de necessitar o texto completo, envie e-mail para a FBASD.

5) PERGUNTA:  Alberto Costa, quais os últimos dados das pesquisas do estudo da memantina na trissomia 21 de pessoas com Síndrome de Down em Cleveland esse ano de 2022?

Resposta (Alberto): Como eu disse na nossa palestra, estamos esperando a resposta de agências de fomento à pesquisa para continuarmos as pesquisas com a memantina em pessoas com síndrome de Down. Na verdade, pela falta de verba (que foi gerada parcialmente pela pandemia), inclusive nossos estudos pré-clínicos com camundongos e células iPS estão andando extremamente devagar. Portanto, com exceção do que disse na palestra sobre o fato de que uma dose três vezes maior do que a recomendada funcionou em modelos de camundongo da síndrome de Down, não temos muitas novidades aqui.    

6) PERGUNTA:  Boa noite. Foi feita alguma avaliação das funções executivas e memória operacional, uma vez que se observam disfunções frontais importantes nesta população.

Resposta (Alberto): Memória operacional foi avaliada em nosso estudo através do teste de rememoração de dígitos, o qual mostrou ser afetada de forma positiva na análise post hoc (ou seja, para aqueles participantes que tiveram um nível plasmático acima de 0,4 μmol/l). Outras funções executivas foram testadas com o teste Go-No Go, spatial span (CANTAB) e o spatial working memory (do CANTAB). Para maiores informações sobre a bateria de testes que usamos, sugiro que leia o nosso artigo de 2018 publicado com acesso livre na revista Brain Sciences (doi:10.3390/brainsci8120205).      

7) PERGUNTA: Parece ter havido uma subdose da memantina, porém doses maiores pode produzir efeitos colaterais importantes;

Resposta (Alberto): Sem dúvida esta é uma possibilidade. É por isso que é tão importante que façamos um estudo restrito, sob condições bem controladas, para investigar essa possibilidade. E também é por isso que, de forma alguma, podemos recomendar o uso desta medicação no presente momento. 

8) PERGUNTA: A memantina requer atuação em receptores NMDA e é possível que haja uma redução do número de receptores NMDA nesta população?

Resposta (Alberto): Se você está se referindo a uma redução do número de receptores de NMDA em pessoas com síndrome de Down com relação à população geral, não existe evidência disso presentemente. Em modelos animais, a evidência é mista, com algumas indicações de ativação excessiva dos receptores de NMDA e indicações de ativação reduzida desses receptores. Se você está se referindo a uma possível internalização dos receptores com o uso crônico da memantina (do tipo que acontece com receptores de GABAA com o uso crônico de benzodiazepínicos), isso é muito improvável, por causa do mecanismo de ação da memantina (bloqueio não competitivo de receptor, sem afetar a ligação do neurotransmissor ao receptor).

9) PERGUNTA:  Seria necessário realizar uma curva dose-resposta, o que é bem complexo em um ensaio clínico.

Resposta (Alberto): Sim, nós entendemos que o próximo passo envolve um desenho bem mais sofisticado que o estudo que foi publicado. Nós estamos propondo um estudo para o encontro da dose ideal da memantina, juntamente com a coleta de dados de farmacocinética. Minha experiência de pós-doc foi em farmacologia (Universidade de Maryland) e fui professor de farmacologia clínica por muitos anos na faculdade de medicina da Universidade do Colorado. Portanto, acho que estou bem equipado tecnicamente para desenhar tal estudo. Além disso, tanto eu como a Dra. Ana Claudia, somos membros da comunidade de pais de pessoas com síndrome de Down, o que nos dá uma sensibilidade especial em termos de nos esforçar ao máximo em limitar potenciais efeitos negativos em participantes de estudos futuros.   

10) PERGUNTA:  Hoje é arriscado ou não recomendado a memantina em doses maiores que a aplicadas nos estudos, mesmo sabendo que nesses estudos não foram observados efeitos colaterais graves?

Resposta (Alberto): Sim, continua sendo arriscado por dois motivos. Primeiro, com as doses recomendadas, não observamos um efeito significativo; e foi com essas doses que efeitos colaterais graves não foram observados. Segundo, para que exista uma melhor chance de se ver um efeito, é provável que tenhamos que usar uma dose mais elevada da droga; e com tal dose, ainda não sabemos se efeitos colaterais graves podem aparecer.   

11) PERGUNTA:  Olá pessoal. Alberto, Ana, algum outro ativo promissor no pipeline (alguma outra substância a ser estudada)?

Resposta (Alberto): Na verdade, este está sendo um ano especial na área da síndrome de Down no sentido de que três estudos duplo-cego estão publicados ou prestes a serem publicados. O primeiro foi o nosso. O segundo foi o estudo da Roche com uma nova droga chamada basmisanil. Infelizmente, o estudo da Roche (cujo estudo fase I eu ajudei a desenhar) não mostrou qualquer efeito positivo significativo e a companhia decidiu descontinuar pesquisas com o basmisanil (https://doi.org/10.1186/s11689-022-09418-0). Um estudo que está para ser publicado envolve o epigalocatequina galato (EGCG), que é considerado um dos principais princípios ativos do chá verde. Mas uma vez, os investigadores não observaram qualquer efeito positivo significativo e é também improvável que continuem essa linha de pesquisa. Existem pelo menos dois ativos promissores no pipeline, mais bem no comecinho do pipeline. Um é um derivado da memantina, chamado nitromemantina e o outro é um inibidor da enzima fosforibulocinase (PKR em inglês). Mas ambos ‘lead compounds’ estão em fase inicial de desenvolvimento, e não espero que sejam usados em estudos fase II por pelo menos uns cinco anos.

12) PERGUNTA: É válido fazer uso da memantina só em algumas ocasiões, por exemplo em época de provas escolares?

Resposta (Alberto): A resposta curta é NÃO! Principalmente porque os efeitos psicotomiméticos (ou seja, coisas do tipo alucinações visuais) acontecem principalmente quando a dose de memantina é elevada bruscamente. Tipicamente, a dose da memantina é elevada devagarinho (5, 10, 15, 20 mg, em quatro semanas) no tratamento de pessoas com doença de Alzheimer; que foi o protocolo que reproduzimos em nosso estudo. Portanto, o uso agudo da memantina não é recomendado. Apesar da memantina ter pouca tendência a produzir vício, um estudo recente, publicado na revista Pharmacoepidemiology and Drug Safety (DOI: 10.1002/pds.5070) mostrou que um dos usos não médicos (e definitivamente não recomendados) da memantina é para ajudar pessoas a “se motivar e concentrar”. 

13) PERGUNTA: Existe risco do uso contínuo da memantina a pessoa ficar dependente da medicação?

Resposta (Alberto): Como disse com relação a sua pergunta anterior, o risco de uma pessoa se viciar à memantina é muito baixo. Contudo, o risco de dependência para qualquer droga nunca é zero.

14) PERGUNTA: Existe estudo sobre a faixa etária que a memantina seria mais benéfica?

Resposta (Alberto): Não. Porque a única indicação médica aprovada para a memantina é a doença de Alzheimer. Mas, como a síndrome de Down é inicialmente uma desordem do desenvolvimento, a ideia é que, caso tenhamos fortes evidências de que a memantina é segura e eficaz, quanto mais cedo a terapia começasse, mais benéfica ela seria. Esta é uma das razões pela qual estamos buscando financiamento para testar esta medicação em pessoas com síndrome de Down em várias faixas etárias.   

15) PERGUNTA: Boa noite. A memantina pode ser usada preventivamente, antes do surgimento de sintomas de Alzheimer?

Resposta (Alberto): Na população geral (ou seja, pessoas sem síndrome de Down), não existe ainda evidência de que a memantina possa prevenir ou adiar o desenvolvimento da doença de Alzheimer. Contudo, não sabemos qual seria o efeito do uso crônico (por muitos anos), na dose correta, em pessoas com síndrome de Down. Gostaria de pensar que existem boas chances de que isso seria possível, mas não tenho qualquer evidência no momento para apoiar esta crença.    

16) PERGUNTA: A duração do uso da medição, por 16 semanas, aparentemente não foi pouco tempo para refletir um resultado positivo?

Resposta (Alberto): A duração curta do uso da medicação foi proposital, para diminuir a exposição à uma medicação para a qual não sabíamos o perfil de potenciais efeitos colaterais em uma população onde a maioria das pessoas têm uma capacidade limitada de fornecer consentimento esclarecido para participar em pesquisa. A ideia era reproduzir o que aconteceu com a pesquisa no modelo animal, onde injeções agudas da medicação produziram um efeito mensurável. Nesse contexto, achamos que 16 semanas seria um bom compromisso entre a possibilidade de observarmos um efeito, que deveria ser bem rápido, e tempo bastante para sabermos mais sobre os efeitos colaterais associados com o uso crônico da medicação. A vantagem de usarmos uma medicação como a memantina é que a farmacologia é bem estudada, e sabemos exatamente qual é a faixa terapêutica da medicação. Portanto, no final das contas, foi bom que tenhamos feito um estudo curto onde aprendemos que a dose usada tipicamente para tratar pacientes com doença de Alzheimer é baixa demais para atingirmos o nível terapêutico. Se tivéssemos feito um estudo mais prolongado, a resposta a esta questão teria demorado mais ainda do que demorou, e teríamos praticamente os mesmos resultados.   

17) PERGUNTA: As pessoas com síndrome de Down podem ficar tomando a memantina sempre ou somente por um período?

Resposta (Alberto): Só para ser claro, não sabemos com certeza ainda se a memantina tem um efeito positivo na cognição de pessoas com síndrome de Down. Mas, pelo que sabemos das propriedades desta medicação, ela funcionaria de uma forma semelhante a medicações do tipo anti-hipertensivos, ou seja, as pessoas com síndrome de Down teriam que ficar tomando a memantina sempre (ou até algo melhor ser descoberto). 

18) PERGUNTA: Quais são os efeitos colaterais que vocês observaram durante o estudo?

Resposta: A memantina foi bem tolerada, com eventos adversos leves a moderados em baixa frequência.

A infecção viral do trato respiratório superior foi o efeito colateral mais comum (11% dos participantes no grupo memantina e 15% no grupo placebo), seguido de tontura transitória (10% no grupo memantina e 8% no grupo placebo).

Também tivemos referência de alguma alteração de humor, dor de cabeça, diarréia/náuseas, insônia e fraqueza, também infrequentes e transitórios, e um participante referiu alucinação visual.

Não foram observados eventos adversos graves

19) PERGUNTA: Houve diferença significativa entre os indivíduos com deficiência leve, moderada e grave?

Resposta (Alberto): Não, nossa análise estatística não mostrou qualquer dependência do efeito da memantina com relação ao nível de deficiência intelectual dos participantes. Contudo, por causa do tamanho pequeno da nossa amostra, não podemos excluir a possibilidade de um nível pequeno de dependência entre estas variáveis.  

20) PERGUNTA: por que os pais superprotegem seus filhos pra não morar sozinho com deficiência?

Resposta: Esta é uma pergunta difícil de responder, pois precisamos considerar a realidade de cada família, sendo muitos os fatores envolvidos. Porém, no geral, observamos que familiares de pessoas com deficiência intelectual tem esta prática da superproteção e infantilização mais exacerbada. Possivelmente existe uma insegurança destes pais em acreditar no potencial de escolhas próprias e decisões destes filhos e filhas, e sabemos que esta postura não contribui para o desenvolvimento de autonomia. Mas temos que considerar também o entorno destas famílias, que muitas vezes podem morar em áreas de maior violência urbana, com pouca acessibilidade, ou recursos de mobilidade, por exemplo.

Enfim, é assunto para um papo bem demorado.

21) PERGUNTA: Só para se ter uma ideia, qual é o nível de investimento que se precisa para dar andamento seguro a um projeto deste porte?

Resposta (Alberto): Com relação a um projeto de um ensaio clínico de busca da dose ideal, envolvendo apenas uma faixa etária (vamos dizer entre 15-32 anos de idade), eu diria entre 750 mil dólares e um milhão de dólares. Para um grupo de cinco projetos envolvendo participantes de seis meses de idade até 55 anos (que seria o ideal), estamos falando de 3,5 a 5 milhões de dólares. Para manter o meu laboratório de ciências básicas (o qual continua fornecendo informações importantes com modelos animais e células humanas para apoiar a nossa pesquisa clínica) funcionando de forma eficaz, precisamos de 500 mil a um milhão de dólares por ano. Ou seja, para seguirmos em frente de onde estamos, com pelo menos um ensaio clínico, precisamos no mínimo de 750 mil dólares e um milhão de dólares. Infelizmente, atualmente, eu gasto aproximadamente 50% do meu tempo tentando levantar dinheiro, o que é contraproducente, dado que minhas áreas de expertise são a medicina e as ciências biomédicas — e não a área de finanças. Portanto, precisamos de toda ajuda que possamos encontrar. Como pai de uma mulher com síndrome de Down, é super frustrante para mim ver tantas possibilidades sendo perdidas simplesmente pela falta de recursos financeiros. 

22) PERGUNTA: Quais os efeitos colaterais da memantina?

Resposta: A memantina foi bem tolerada, com eventos adversos leves a moderados em baixa frequência.

A infecção viral do trato respiratório superior foi o efeito colateral mais comum (11% dos participantes no grupo memantina e 15% no grupo placebo), seguido de tontura transitória (10% no grupo memantina e 8% no grupo placebo).

Também tivemos referência de alguma alteração de humor, dor de cabeça, diarréia/náuseas, insônia e fraqueza, também infrequentes e transitórios, e um participante referiu alucinação visual.

Não foram observados eventos adversos graves.

23) PERGUNTA: Existe relação entre a memantina e as placas amilóides?

Resposta (Alberto): Em modelos animais, a memantina reduz os níveis do peptídeo a-beta (as principais moléculas que formam as placas amiloides) na região do córtex cerebral e do hipocampo. Contudo, não existe evidência clínica de que este medicamento tenha o mesmo efeito em seres humanos. Minha esperança é que encontremos uma dose ideal da memantina para pessoas com síndrome de Down, que este medicamento seja testado num estudo grande de fase III, seja aprovado e que passe a ser usado de forma prolongada em pessoas adultas com síndrome de Down. Com isso teremos os dados necessários para saber se a memantina é benéfica ou não em reduzir a taxa de progressão da patologia de Alzheimer em pessoas com síndrome de Down.  

24)  PERGUNTA: A Memantina tem um efeito contra lateral ?

Resposta: A memantina foi bem tolerada, com eventos adversos leves a moderados em baixa frequência.

A infecção viral do trato respiratório superior foi o efeito colateral mais comum (11% dos participantes no grupo memantina e 15% no grupo placebo), seguido de tontura transitória (10% no grupo memantina e 8% no grupo placebo).

Também tivemos referência de alguma alteração de humor, dor de cabeça, diarréia/náuseas, insônia e fraqueza, também infrequentes e transitórios, e um participante referiu alucinação visual.

Não foram observados eventos adversos graves.

25)  PERGUNTA: Esta medicação melhora a inteligência? É pra ficar “normal”?

As pessoas com síndrome de Down precisam entrar num padrão?

Resposta: A memantina é uma medicação que interfere em alguns circuitos cerebrais, e com isto, tem o potencial de influenciar a performance de algumas funções cognitivas, como a memória por exemplo. Atualmente o conceito de inteligência é muito mais amplo, e aqui, não estamos falando de melhorar a inteligência. O nosso objetivo é obter melhora de funções cognitivas e assim, impactar na qualidade de vida das pessoas com síndrome de Down.

Pessoas com síndrome de Down (e outras pessoas também) não precisam estar num padrão, mesmo porque cada pessoa é de um jeito. E inclusive, temos uma diversidade grande em termos de comprometimento cognitivo na T21, e talvez as pessoas com maior comprometimento cognitivo se beneficiem mais destas intervenções: precisamos fazer estudos comprovar isso.

26)  PERGUNTA: Porque os filhos dos pesquisadores não participaram do estudo?

Resposta: Na pesquisa clínica precisamos estar muito atentos nas questões de conflito de interesses. Um conflito de interesse surge quando o interesse básico da pesquisa é influenciado por um interesse secundário que pode prejudicar o julgamento profissional e os objetivos do projeto.

Apesar de ambos os pesquisadores possuírem filhos com síndrome de Down em idade de poder participar deste estudo, a participação dos mesmos poderia, mesmo que hipoteticamente, causar algum prejuízo na condução ou avaliação do estudo. Portanto, existe uma orientação dos Comitês de Ética de que familiares de pesquisadores não participem das pesquisas que estão conduzindo.

27)  PERGUNTA: Estes testes neuropsicológicos que vocês fizeram, podem ser aplicados em qualquer pessoa com síndrome de Down?

Resposta (Alberto): Sim, certamente podem ser aplicados em qualquer pessoa com síndrome de Down. Contudo, primeiramente convém lembrar que alguns destes testes neuropsicológicos são mais apropriados para o uso em pesquisa do que para avaliações clínicas. Segundo, a maioria deles tiveram que ser traduzidos para o português, por não serem disponíveis no Brasil. Isso foi suficiente para o nosso estudo de pesquisa porque tínhamos dados de pessoas com síndrome de Down de Colorado e Cleveland, que usamos para confirmar que as testagens que fizemos eram confiáveis. Para que sejam usados em avaliações clínicas, é preciso primeiro que tais testes sejam validados por neuropsicólogos no país onde ele será utilizado, e isso ainda não foi feito para vários desses testes.       

28)  PERGUNTA: Se aumentar a dose desta medicação, não vai ter mais risco de reações?

Resposta: Esta é uma pergunta para a qual ainda não temos resposta. Sabemos de estudos com esta mesma medicação onde foram utilizadas até três vezes a dose que usamos na nossa pesquisa (neste estudo usamos a memantina na dosagem de 20mg/dia). O senso comum nos faz pensar que se aumentarmos a dose, temos mais risco de ter reações ou efeitos indesejados. Por isso é tão importante seguirmos estudando, pois como observamos nos nossos resultados, pode ser que adolescentes e jovens adultos com síndrome de Down necessitem de doses maiores para termos o efeito desejado. Resta saber se doses maiores serão seguras.

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